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Ruelas e luminosos integram a paisagem

GOLDEN GAI
COPO MEIO CHEIO

Um conjunto de vielas estreitas e cheias de história compõe o reduto boêmio mais autêntico de Tóquio

texto e fotos: Meg Yamagute

As plantas na porta, quase obstruindo a entrada, guardam um salão minúsculo, escuro e sem janelas. Entre as fotos penduradas na parede, a maior mostra um grupo de amigos em um festival de música e poderia estar em qualquer bar alternativo do mundo. Mas se trata de Golden Gai, o amontoado de vielas boêmias com cerca de 200 estabelecimentos no meio de Shinjuku.

 

Um dos jovens da foto é Kazu-san, hoje um senhor magro, cuja longa barba branca cobre parte do sorriso leve e persistente. Ele é dono do bar desde os 18 anos, quando deixou uma potencial carreira de músico por uma mulher e uma vida mais estável. Eu provavelmente jamais teria entrado se não fosse a gentileza do proprietário, que regava as plantas quando perguntei se havia um bar de jazz nas redondezas aberto em um domingo à noite. Recebi essa “missão” de um dos clientes da tour guiada que faço pela região – há alguns anos, Golden Gai atrai turistas a despeito dos espaços diminutos e nem sempre convidativos a estrangeiros.


Depois de me conduzir algumas vielas acima para mostrar o tal bar de jazz, que estava fechado e talvez o único do gênero em Golden Gai, Kazu-san desapareceu. Será que passei da conta nos highballs durante a tour da noite? A resposta veio logo depois, quando consegui refazer o trajeto labiríntico e voltar ao bar do meu novo amigo.

História marginal

Os minúsculos estabelecimentos de Golden Gai foram criados para facilitar os encontros entre profissionais do sexo e clientes, depois do fim da Segunda Guerra Mundial. A prostituição deixou de ser legalizada em 1958, mas a área manteve sua aura alternativa e passou a ser reduto de artistas e boêmios. Hoje, Golden Gai também atrai estrangeiros, mas muitos bares não têm cardápio em inglês e ainda prezam pelos clientes regulares.

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Clientes regulares são valorizados no Golden Gai

História de uma vida

Pedi para dar uma espiada e ele gentilmente me conduziu para dentro. Kazu-san contou que é boêmio desde sempre e frequentava Golden Gai quando o lugar ainda era reduto de artistas que não ligavam para o passado da área, uma zona de prostituição no pós-Segunda Guerra. Quando surgiu a oportunidade de adquirir um bar por ali, ele não pensou duas vezes.

 

Perguntei se o violão era só parte da decoração e pedi uma bebida – a propósito, nada é mais rude em Golden Gai que ocupar os bares minúsculos com o copo vazio. Empolgado e tímido ao mesmo tempo, Kazu-san pegou o instrumento e começou a afinar. A voz nostálgica e a música triste, em inglês e japonês, foram a trilha sonora da história dele: sentia falta da mulher, que o deixara e levou os filhos, principalmente em noites frias  e chuvosas como aquela. Vimos juntos um velho álbum de fotos e em pouco tempo pareceu que eu conhecia Kazu-san há anos.

Depois da noite de cumplicidade, visitei o bar várias vezes. As conversas passaram a ser mais animadas, envolvendo histórias  de visitantes ilustres, como o cineasta Guy Ritchie e a banda The Killers. Os escoceses do Franz Ferdinand bateriam ponto ali quando se apresentam em Tóquio. Em uma das minhas idas ao bar, dessa vez com clientes, ousei perguntar se Kazu-san não repetiria o show particular. Ele foi categórico: “Aqui eu sou só um bartender. Alguém quer pedir a bebida?”

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Kazu-san, personagem de Golden Gai

Como usar (com moderação)

SOZINHO OU EM DUPLA A melhor forma de aproveitar Golden Gai é em pequenos grupos ou sozinho. Além de os bares serem minúsculos (é quase impossível encontrar um que acomode a turma toda), o melhor da noite é interagir com outros clientes e bater papo – para quem fala japonês, claro.

 

TABLE CHARGE A cobrança de uma taxa por pessoa nos bares de Golden Gai é justificada. Como os frequentadores regulares costumam pedir garrafas inteiras de destilados para beber em diferentes visitas, inclusive com amigos, a table charge evita que o cliente ocupe lugar sem gastar nada por muitas noites consecutivas. Ou seja, trata-se de uma forma de manter a receita da casa: vale estar preparado.

 

COM MUITO GELO O highball é a especialidade de muitos bares da área. Além de ser uma boa forma de beber uísque a noite toda, o drinque que mistura Suntory White Label, soda e muito gelo leva os clientes antigos de volta ao passado. São profissionais de várias áreas, bem-sucedidos ou não, que continuam pedindo a bebida para sentir o sabor da juventude, quando andavam de bolsos vazios, mas não economizavam em sonhos.

Serviço

GOLDEN GAI

Tokyo-to Shinjuku-ku Kabukicho 1-1-6

Neta de japoneses, MEG YAMAGUTE vem descobrindo, desde que chegou ao Japão em 2006, o sentido de muitas tradições adotadas por sua família . Como guia turística compartilha suas descobertas em tours incríveis.

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