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mistura quente
JAPÃO, NEPAL E UMA
PITADA DE BRASIL

Um encontro apimentado de culturas e sabores dá o tom das criações servidas no ADI, restaurante nepalês contemporâneo em Nakameguro

texto: Carol Pezzutto
fotos: Carlos Kato
produção: Roberto Maxwell

Um novo começo: é o que o casal Asumi Adhikari, 38 anos, japonesa, e Kanchan Adhikari, 33, nepalês, buscava quando abriu o ADI, restaurante que funciona desde 2020 em Nakameguro, um dos redutos gastronômicos mais charmosos de Tóquio. A área, que enfileira bares, cafés e restaurantes de bom padrão, muito deve de seu apelo ao Rio Meguro e aos elegantes prédios que margeiam o canal. Diante de tanta concorrência parece difícil se diferenciar – mas o ADI consegue, graças à mistura inusitada (e apimentada) de influências nepalesas, japonesas e brasileiras em releituras contemporâneas. A propósito, ADI significa “começo” em sânscrito.

O Brasil entra nessa história em duas frentes: Asumi morou durante seis anos no país, fala português fluentemente e admira a cultura, representada no chorinho persistente que aquece a trilha sonora do salão de apenas oito lugares. Kanchan, por sua vez, diz ter em Alex Atala, um dos maiores chefs brasileiros, uma grande inspiração para criar as releituras de pratos típicos nepaleses. “Quando estava abrindo o restaurante assisti ao episódio da série Chef’s Table na Netflix sobre ele. Vi que trabalhou na Itália e França, mas decidiu voltar ao Brasil e fazer comida típica usando ingredientes locais, valorizando as pessoas e celebrando a Floresta Amazônica. Sonho em ser como ele, quero fazer a comida do meu país com produtos regionais e, assim, divulgar a cultura nepalesa pelo mundo”, diz Kanchan, que é autodidata. Ele conta ainda que assim que a pandemia terminar quer conhecer o Brasil. 

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Asumi e Kanchan: entre muitas coisas em comum, o amor pelo Brasil

Com pimenta, sem cardápio fixo

Saborosas, coloridas e condimentadas, as criações de Kanchan incluem, por exemplo, uma releitura do dal bhat, um prato típico nepalês, composto por pequenas porções de arroz, feijão, dois tipos de curry e vegetais picantes e polpa de bambu com molho de iogurte e especiarias.  Embora estejam entre suas especialidades, não há garantia que eles vão estar no menu. Isso porque o chef investe em um cardápio que muda diariamente e prima pelos ingredientes sazonais. Trata-se de um desafio criativo constante, cujo objetivo é explorar o máximo potencial de cada um dos itens entregues pelos fornecedores locais. “Quando você usa apenas aquilo que tem nas mãos, passa a conhecer melhor os ingredientes do Japão sem deixar de se aprofundar na cultura nepalesa”, diz.

O menu-degustação é composto por sete pratos, incluindo a sobremesa, e custa 6.600 ienes. Apesar do Nepal não ter costa marítima, peixes e frutos do mar estão presentes na maioria deles, tal como ingredientes pouco usuais nesse tipo de cozinha, como melão, bambu e camarão. Combinações que parecem impossíveis ganham vida em criações como a do prato de entrada, formado por meias esferas de uma massa fina de semolina frita recheadas com ouriço e ovas de peixe. “Aqui, tenho a oportunidade de misturar elementos que aparentemente não fazem sentido, mas que funcionam no resultado final”, diz Kanchan.

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Pani Puri com Ouriço e Melão: encontros inusitados

Em comum às receitas, um componente: a pimenta. Como um bom representante da culinária sul-asiática, a comida do ADI tem tempero e picância marcantes, trazendo à tona aquele calor instantâneo tão associado ao condimento. Entre as mais utilizadas pelo chef estão a timmur e a hariyo khursani, a primeira é conhecida por seu sabor marcante e levemente cítrico, já a outra é mais forte e deve ser usada com moderação. A apresentação esmerada é composta por louças japonesas modernas em contraste com as cores vivas dos ingredientes.

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Pimentas e especiarias marcam a comida do ADI

De maneira geral, a comida nepalesa é mais apimentada e condimentada que a brasileira, mas é justamente essa combinação de ingredientes que surpreende durante a degustação – para quem aprecia e tolera pimenta, o ADI é um prato cheio. 

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“Quando comecei a cozinhar, mergulhei de cabeça e percebi que a comida não deve servir apenas para agradar o cliente, mas também para resgatar memórias e representar a cultura do meu país. Então, quando estou na cozinha, sempre busco levar novos sabores nepaleses para a mesa.”

Kanchan Adhikari

No diminuto salão, uma atmosfera aconchegante resulta do contraste entre o piso e as paredes de concreto e detalhes de fibra natural e madeira rústica – os lustres de vime suspensos sobre as mesas foram feitos à mão pela mãe de Asumi. Braço direito do marido à frente do restaurante, ela comenta as influências por trás do ADI. “Morei alguns anos no Brasil e amo música cabo-verdiana. Kanchan tem parentes em Portugal e em Goa, um estado da Índia que teve muita influência portuguesa. A cultura lusófona é muito presente na nossa vida e se reflete no que fazemos aqui”.

Diversidade é o mote dos nos pratos do Adi

De volta às origens

Embora tenha uma proposta consistente e esteja em um dos redutos gastronômicos mais descolados de Tóquio, o ADI pode acompanhar Asumi e Kanchan na realização de um desejo: mudar-se para o Nepal. “Nossa ideia é daqui a dez anos é ter uma pousada em um lugar bem bonito, com bastante natureza, e nesse mesmo local abrir um restaurante. Queremos muito ter a experiência de viver no país de origem do meu marido e levar para lá toda a bagagem acumulada no Japão”, diz Asumi.

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Choila de Porco: diálogo de tradições até no empratamento

Apesar de cozinhar há apenas dois anos, o chef parece ter uma ligação com seu trabalho e suas raízes que fica evidente em todos os detalhes do ADI, da comida ao ambiente. “Quando cozinho, me conecto com as duas culturas e sinto que tudo o que faço me insere nelas. Às vezes me lembro das memórias de infância, da comida da minha mãe ou das coisas que experimentei no Japão”, afirma Kanchan.

Quando ele disse isso, foi como se eu tivesse descoberto o significado de comida boa – aquela preparada pela mãe, que proporciona boas memórias e reúne todo mundo em volta da mesa. Aquela que perfuma o ambiente com temperos, mas também é capaz de emocionar. Pela primeira vez, senti gosto de casa em uma culinária que nunca havia provado.

ADI

Tokyo-to Meguro-ku Kamimeguro 2-46-7

www.adi-tokyo.com (em japonês)

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CAROL PEZZUTTO é jornalista freelancer, criadora de conteúdo e consultora de marketing. Curiosa, está sempre em busca de novidades, adora aprender sobre culturas e pessoas. Mora em Tóquio há 2 anos e meio e ainda se surpreende com o Japão todos os dias.

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