Coletivo teamLab traz para Tóquio a colaboração que já faz sucesso em Kyoto, mas a experiência gera sentimentos mistos no nosso repórter
Quem está acostumado a comer lámen em uma grande cidade do Japão sabe que a validade do cliente vence rápido. O prato não demora, o comensal suga a massa com a sopa ainda pelando e vai embora sem muitas cerimônias. Por isso, quando o teamLab se envolveu no projeto do Vegan UZU Ramen de Kyoto — o grupo é responsável pelo design do espaço e, claro, pelas obras de arte —, o que se esperava era uma mudança radical no modo de consumir este prato, que é uma das mais populares formas de fast food do Japão.
O sucesso foi imediato. Inaugurado em março de 2020 — ou seja, quando ainda não se tinha ideia muito clara do novo coronavírus —, o restaurante de apenas 16 assentos dava filas extraordinárias, com horas de espera. E, por incrível que pareça, em nenhum momento se deu o devido destaque para o fato de que ali estava sendo aberta a primeira casa dedicada somente a lámens veganos em Kyoto. Raros espaços têm até alguma opção vegana, mas era a primeira vez que uma casa abria mão de derivados de carne em todo o cardápio na antiga capital japonesa.
Pouco mais de um ano e meio depois, o UZU chega a Tóquio cercado pelo mesmo burburinho. Adjacente à exposição Planets do teamLab, o pequeno espaço é dividido com uma minúscula floricultura e lembra um mini-salão de clube, com suas paredes e mesas espelhadas. São elas — e a onipresente trilha sonora — que criam a imersão na obra proposta pelo grupo. Aqui, no caso, uma versão do trabalho Reversible Rotation - Non-Objective Space, que explora a caligrafia japonesa.
O espaço, embora interessante do ponto de vista artístico, é relativamente claustrofóbico. Além disso, ter uma refeição como um lámen num local fechado com projeções não me pareceu algo para se repetir com muita frequência. De qualquer modo, é bom saber que é possível comer em outras áreas, fora do salão.
São duas possibilidades: uma mesa espelhada que também é uma obra de arte e ganhou o nome de Table of Sky and Fire e uma espécie de banco sem início ou final chamado de One Stretch Bench. Em ambos os casos não existe proteção contra as intempéries. No dia da minha visita, por exemplo, o sol da tarde estava forte e — será que ninguém pensou nisso? — a luz refletia no espelho de tal forma que tive que comer de óculos escuros. Além disso, o vento quase detonou a apresentação maravilhosa do lámen, com espumas e uma generosa porção de verdes apetitosos.
Contando dessa maneira pode até parecer que a visita ao Vegan Ramen UZU foi perrengue. A grande verdade é que o que deveria ser o principal na história toda — o lámen — não deixa nada a desejar. São quatro opções: Miso Vegan Ramen, Green Tea Vegan Ramen, Flower Vegan Ramen e Soy Sauce Vegan Ramen.
As sopas são feitas tendo como base o cogumelo shiitake de fabricação nacional e a alga kombu — vinda de Rausu, uma vila de pescadores na ilha de Hokkaido, no norte do país. Ambos são cozidos por mais de 12 horas a baixa temperatura junto com cebola, salsão, gengibre e alho. Já a massa é feita com uma mistura de farinha branca de trigo produzido em Hokkaido e farinha de trigo integral vinda da província de Miyagi, no nordeste do país. Em ambos os casos, a matéria-prima utilizada na massa é produzida de forma orgânica, segundo o restaurante.
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Cada prato ganha a adição do sabor correspondente à sopa-base. O Soy Sauce Vegan Ramen (¥1320), por exemplo, leva shoyu artesanal e óleos aromáticos e é finalizado com uma generosa fatia de tomate e algumas verdurinhas. Degustei o lámen no salão fechado. É um prato bom, que casa bem com a massa saborosa, mas tem uma limitação. "Nem parece vegano", diz o restaurante na apresentação e isso talvez explique o sabor forte para a sopa — que lembra um consomê. Dependendo do paladar, o prato pode ser considerado enjoativo.
Já o Flower Vegan Ramen (¥1980) foi degustado — de óculos escuros — na mesa espelhada que fica do lado externo. A apresentação é uma ode à gastronomia vegana: com folhas e flores, além de uma espuma que não traz grande sabor mas compõe que é uma beleza. Parece um prato tirado de um sonho, mas foi inspirado no Floating Flower Garden, uma das obras da exposição-mãe, Planets.
E não é só a apresentação. Aqui, a sopa descrita lá em cima faz muito mais sentido. O equilíbrio entre umami, doçura e acidez prometido no menu está ali de uma forma extraordinária. A massa escorrega entre o caldo e as flores e verduras trazem ainda mais frescor para a sopa fria. Um copinho de água com gás é servido juntamente com o prato para ser adicionado à sopa que sobra — e bebido — quando o macarrão acaba. É um belo final para um prato excepcional.
A degustação não para por aí. A casa oferece como sobremesa o delicioso sorvete vegano da Picaro Eis, uma pequena sorveteria de Kyoto, comandada por um japonês que estudou em Berlim e que tem conquistado o público local com seus sabores diferentes. No UZU Tokyo, eles são quatro: pistache com chá verde, gengibre branco com lírio, ruibarbo rosa e menta com pepino.
Já a carta de bebidas é formada por diversas possibilidades envolvendo chás verde, hoji e de camomila. Suco de tangerina e água com gás completam a lista junto com a Hakone Kohaku, uma cerveja frutada da Gora Brewery, empreendimento do chef Nobu Matsuhisa nas montanhas da província de Kanagawa, vizinha a Tóquio.
Combos que incluem uma bebida e uma sobremesa, além da entrada no espaço do salão do restaurante, custam a partir de ¥2200. Visitantes podem frequentar o restaurante sem a obrigatoriedade de entrar na exposição Planets, que custa ¥3200 e vale a visita.
Sem dúvida, a associação do UZU com o teamLab beneficia ambos os lados, com a balança das vantagens pesando muito para o restaurante. Afinal, o teamLab é um nome estabelecido e, até o momento, tudo o que o coletivo toca vira ouro. No entanto, de certo modo, é uma pena que um restaurante de lámen tão ousado esteja tão atrelado às obras de arte. A verdade é que o UZU serve comida que merece ser degustada com calma, numa mesa ou num balcão apropriados. Ainda assim, pode-se dizer que fazer uma refeição dentro de uma obra do teamLab é tudo menos uma experiência desprezível. Ou seja, vale a pena e, sim, muita gente vai amar. Mas, um dos poucos espaços de lámen vegano da capital japonesa merecia mesmo era brilhar num palco próprio.
SERVIÇO
Vegan Ramen UZU Tokyo
Tokyo-to Koto-ku Toyosu 6-1-16 - teamLab Planets TOKYO [mapa] vegan-uzu.com
Agradecimentos ao chef Carlos Fukuy (@carlosfukuy) que relembrou seus tempos de audiovisual e atuou como câmera na produção do vídeo de divulgação desta matéria.
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